Por: Alexandre Mendes
Desceram a colina, depressão abaixo, na direção de uma casa feita de tijolo queimado e telha de amianto. Antes de chegaram até a porta, guardaram as armas nas cinturas. Um cachorro surgiu dos fundos da casa, latindo no pé do cavalo. Antes que Odimar pudesse bater na porta, ela foi aberta, com o escândalo do vira lata. Um homem de barba negra e comprida atendeu a porta.
- Pois, não. – Disse o homem, estalando os dentes. Parecia ter algum tipo de resto de comida, agarrado entre eles. – Silêncio! Catucha!
- Boa tarde. Nós estamos andando pela mata, há muitas horas. Estamos morrendo de sede e, essa senhora, quer dizer, a minha mãe foi mordida por uma cobra coral. Precisamos de ajuda.
- O hospital público fica há quinze minutos daqui. Vou pegar água pra vocês. Depois, eu os guio até lá.
- Muito obrigado, meu amigo! – Agradeceu Alcebíades, enquanto verificava a febre de Nonó.
Mataram a sede com aquela água tratada e estranharam o sabor de cloro.
Acompanharam o homem pelas ruas de paralelepípedo. As calçadas eram bem estreitas e, em alguns trechos, eram obstruídas por tufos de matos. O vai e vem de cavalos e seus donos era, frequentemente, interrompido pelos caminhões de placas longínquas.
Os casebres se amontoavam, lado a lado. O comércio local era constituído por pequenos armarinhos, com todo tipo de bugiganga disponível e botecos, com grandes prateleiras de tábua, repletas de garrafas de cachaça e seus consumidores.
O homem apontou para o fim da rua. – Vejam! Podem desamarrar a senhora que já chegamos!
Contemplaram a pequena praça, anexa ao tal hospital, que na verdade, mais parecia um pequeno posto de saúde.
Odimar pôs-se a desatar Nonó do cavalo. Alcebíades amarrou a rédea no poste. O filho, então, pegou a sua mãe no colo e adentrou o portão enferrujado do ambulatório.
O posto de saúde era bem simples, com paredes sujas de barro e marcas de mão. Em volta da porta, havia algumas cadeiras velhas de madeira podre, ocupadas por dezenas de pessoas sentadas, aguardando o atendimento. A fila excedia o número de cadeiras e tomava forma de minhocão, até o portão principal.
Alcebíades cantarolou na porta do ambulatório: - Olaá! Tem alguém aií?
Uma senhora gorda de jaleco branco e óculos aro grosso, apareceu na porta, olhou a situação e pediu que trouxessem a mulher para dentro, causando palavras de revolta na fila.
- O quê foi que aconteceu com ela? – Perguntou a senhora, olhando para o relógio.
- Ela foi mordida por uma cobra coral.
A mulher pediu que Odimar colocasse a enferma no chão gelado do posto, no canto da parede. Todas as macas disponíveis estavam ocupadas por moribundos agonizantes. Ela não seria a única a ser atendida no chão: Uns dez doentes, já lhe faziam companhia.
A mulher do posto tirou a tala do ferimento e sentiu o mau cheiro:
- È... acho que está infeccionando. – Disse ela, dirigindo-se a uma porta, com a palavra “Medicamemto”, escrita a mão, em sua face externa.
- A senhora é a médica? – Perguntou Alcebíades para a mulher, que se ocupava de preparar um medicamento intravenoso.
- Médica? Eu? – Debochou a funcionária. – Meu filho, não aparece um médico por aqui, faz uns dois anos. Mas, temos medicamentos que ainda estão na validade. Isso já basta!
Preparou o escalpo e pendurou o soro em um prego previamente posto na parede, com esse objetivo. Aplicou o remédio na veia de Nonó, que ainda balbuciava palavras delirantes.
- O mar...o mar...que mato vermelho!
- Pronto! Agora é só esperar a febre baixar. Vai acabar tudo bem! – Disse a funcionária “Bombril”. – Vamos fazer a fichinha dela, então?
De repente, os gemidos dos moribundos foram abafados pelo cantar de pneus, no exterior do posto.
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