Por: Alexandre Mendes
O velho ainda não havia percebido que seu filho não estava na cabana. Após gritar três vezes por Odimar e não obter resposta, Alcebíades levantou-se lentamente do leito. Sua cabeça ainda rodava um pouco. Apoiou-se com a mão do braço bom, na parede de palha e barro. Seu braço quebrado estava imobilizado pelos gravetos e a gaze velha, por isso, doía bem menos, agora.
Odimar chegou derepente, trazendo algumas plantas medicinais, para o braço de seu pai. Amarrado por uma corda e pendurado em seu ombro, um lagarto de um metro e pouco: estava garantida a refeição por uns dois dias.
- Não fique de pé, descanse mais um pouco. – Disse ele, colocando seu braço em volta de Alcebíades, como quem quer colocar um bebê no berço.
- Meu filho, sua mãe corre perigo! Precisamos ir até a nossa casa antiga, temos que buscar Nonó! – Disse o velho, extremamente angustiado.
- O senhor não pode ir: está muito mal, ainda. Deite-se. Eu busco a mãe sozinho.
- E se tiver mais de um capanga atrás da gente? Você vai precisar de ajuda. – Disse Alcebíades.
Odimar levantou as raízes que trazia na mão esquerda. – Vou deixar este chá pronto para o senhor beber. È antibiótico e fortificante. Vou sangrar esse lagarto. Se eu demorar, o senhor assa a carne na lenha que eu vou deixar pronta.
Odimar acendeu a fogueira para cozinhar as raízes. Colocou água turva do poço que cavou ao lado do casebre, no único recipiente que tinha para cozinhar. Aquela panela, amassada e velha, ainda era uma lembrança do que ele tinha trazido da casa velha, consigo. Equilibrou-a sobre a grelha enferrujada, com calços de pedra. Logo que as labaredas se estabilizaram sob a panela, colocou as raízes lavadas dentro dela e tampou com uma chapa velha de alumínio. Pegou uma faca e abriu o lagarto na linha do abdômen. Retirou a sua pele escamosa com maestria cirúrgica. Arrancou as suas tripas e depois, o pendurou de cabeça para baixo em um tripé de bambu, nos fundos da cabana. Deixou tudo pronto para seu pai se virar por uns dois dias, enquanto ele iria buscar a sua mãe.
Colocou uma calça comprida, camisa de botão e uma botina desbotada em seu pé: Havia comprado a roupa na cidade de Itapopeba, com o dinheiro da venda de banana na feira central. Guardou-a para usar em uma ocasião especial, como ir ver a sua mãe. Pegou o 38 carregado de balas, trazido por Alcebíades e colocou-o na cintura. Pendurou o facão na cinta e colocou o chapéu de coro velho, que um dia havia sido de seu pai.
- Pai, vou buscar a mãe. O remédio está no fogo. É só botar pra esfriar e beber. Lava o lagarto e coloca na grelha, quando ele secar no sol.
Odimar encheu o cantil de plástico e o amarrou do lado esquerdo da cinta. Deu um beijo na testa de seu pai que, calado e triste, manteve-se em silêncio, durante o desenrolar da cena. Pegou a trilha que corria próxima a margem do rio, na direção da casa de seus pais. Calculou umas seis horas para chegar até lá. Seu coração batia forte e o suor escorria pelo seu rosto. O sol escaldante abatia o matuto, agravando o seu stress. Preocupava-se com o porvir. - “E se eu me deparar com um pau-mandado do Seu Sebastião? Vou ter que matar!” – Dizia enquanto pegava a arma na cintura. Sua vida dependia daquelas seis balas no tambor...
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