O COLETIVO ZINE É UMA AÇÃO CONJUNTA. A PROPOSTA É REUNIR DIVERSOS FANZINEIROS OU CRIADORES INDEPENDENTES E PRODUZIR UM TRABALHO COLETIVO. CADA PARTICIPANTE CONTRIBUI DA FORMA COMO PUDER, SEJA NA CRIAÇÃO, MONTAGEM, EDIÇÃO, ADMINISTRAÇÃO, DIVULGAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO. O IMPORTANTE É SOMAR ESFORÇOS. E ASSIM MULTIPLICAR A DIVULGAÇÃO DO TRABALHO DE CADA AUTOR E DIVIDIR O TRABALHO. SE DER CERTO,CONSEGUIREMOS CHEGAR A NOVOS LEITORES QUE JAMAIS CONHECERIAM NOSSO MATERIAL SE O PROMOVÊSSEMOS ISOLADAMENTE. E NA PIOR DAS HIPÓTESES, AO MENOS TEREMOS UMA DESCULPA PARA INSANAS FESTAS DE CONFRATERNIZAÇÃO E LANÇAMENTO DE ZINES. ENTÃO, MÃOS À OBRA. MISTURE-SE.

quinta-feira, 25 de maio de 2017

O FILHO DA EXCLUSÃO

Por: Alexandre Mendes

(ao Diego El Khouri)

Artista desconhecido
o presente, presenteia-o
com o fogo dos céus do Olimpo
trazido por Prometeu
Não te aborreças por Heitor
e a Tróia fragilizada
desembainhe a sua espada
a peleja irá começar

Será belo o dia
em que todos os seres 
e também os não seres
decifrem as tragédias 
que contam em seus dizeres
palavras de sabor trazido das vinícolas
Baco pelo palco a rolar
contemporânea atitude maldita
Sofrer por amor, jamais odiar

Filho...Tu és filho da Exclusão
chinelo remendado de arame
blusa rota de furo sovaco
unha nua na ponta da meia
estômago de infinito buraco

Exclua o filho...
pois deve-se respeito ao pai
Atenas um minuto de silêncio
amor a sabedoria 
e nada mais.
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domingo, 14 de maio de 2017

MÍNIMO

    Por: Alexandre Mendes

Lambe logo o meu chão,
meu escravo; desgraçado
Deixa tudo bem limpinho,
porque eu pago seu salário

Pega esponja e desinfeta,
fedorento sanitário
Deixa tudo bem cheiroso,
porque eu pago seu salário

Serve logo meu almoço,
tô com fome, ordinário
Quero ver o seu sorriso,
porque eu pago seu salário

Agora, compra meu cigarro,
não demora, meu lacaio
Quer ouvir um desaforo?
Porra, eu pago seu salário!

Te humilho com prazer
Quero você conformado
Nós nascemos para isso
e eu pago seu salário

TROPA DE ELITE

Por: Alexandre Mendes
-Opa, opa! Perdeu!- disse o policial que chegou sorrateiramente por trás do rapaz. - Fumando maconha na rua! Bonito! - E deu logo um cachação no pé da orelha do moço.
- Que isso! Peraí! É só uma pontinha. Estou chegando do serviço agora. Sou trabalhador. Não passa quase ninguém por essa rua, então decidi queimar aqui mesmo!
-HAHAHAHA! Ele falou que é trabalhador! - Disse o milico para o seu colega, que se aproximava com a pistola na mão.
- Trabalhador e maconheiro? Tu é vagabundo! - Gritou o soldado, enquanto golpeava o rapaz na barriga.
-Pô, eu sou servente de obra. Pode ver, minhas mãos são cheias de calos.- Murmurou o infrator, com a voz trêmula de medo. O segundo policial aproveitou as mãos estendidas do indivíduo e resolveu lhe dar um corretivo com o cacetete em suas palmas.
- Filho da puta! Só tem essa bagana? Cadê o bagulho?
- É só isso...- Olhos lacrimejando.- Só essa pontinha!
O policial que chegou primeiro fitou-o com os olhos vermelhos de ódio. Puxou uma trouxinha de cocaína do bolso e lhe disse:
-Ô seu mané! Isso aqui é seu e tu vai em cana.
-Não! Não! Por favor! Eu tenho uma filha pequena e...
- Tomá no cú! Não te perguntei nada!- Vociferou o soldado, dando-lhe mais um tapa na cara.- Meter você na cela dois. O xerife adora mulher magrinha! HEHEHEHE...
- Não... Espera, vamos negociar. Tô com o pagamento da semana aqui. Pode levar tudo. - Disse o servente de obra, já com a cara vermelha de tanto apanhar; face intumescida pelas lágrimas.
- Passa pra cá!- Ordenou um dos carrascos para a vítima.  Após a contagem do vencimento da semana do indivíduo, o policial argumentou truculentamente:
- Cem é pouco! Dá o relógio!
O rapaz tirou o relógio do pulso e, rapidamente, o entregou a autoridade presente. Pensava em nunca mais passar por aquilo em sua vida. Entrar para uma igreja evangélica. Usar Deus para esquecer sua miséria, ao invés do fumo proibido.
-Ô otário, tá vendo essa reta aqui? Te dou cinco segundos para sumir no horizonte. - Ordenou-lhe, um dos homens da lei.
O elemento não pensou duas vezes: Como uma flecha, sumiu na esquina.
Os policiais seguiram na direção contrária, dobraram a esquina e entraram na patrulha.
- Segura sessenta contos que eu te devia dez, lembra?
-Tranquilo... fica com o relógio, pois não gostei da cor e...estica logo essa farinha no espelho que eu tô cheio de sono!

GG ALLIN



Por: Alexandre Mendes

Vê aquela flor?
Um dia, ela foi rosa
perfumada, bonita
impávida e formosa.
Hoje, jaz no triste limbo
seca, cinza e horrorosa

Vê aquele animal?
Um dia teve sorte
abanando a cauda,
alegre e forte.
Hoje, expele dolorosos vermes
esperando a própria morte

Vê aquela construção?
Um dia foi admirada
retilínea, colorida
janela e porta cor de prata.
Hoje, abalada e vazia
entregue à cupim e barata

Vê aquele homem?
Um dia foi contente
hábil, musculoso
viril e atraente.
Hoje, acamado e febril
cheio de escaras, inconsciente

Vê o nosso mundo?
Um dia foi arejado
água limpa; solo rico
clima ameno e temperado.
Hoje é superaquecido,
poluído e desmatado

Vê como é o destino?
Um dia é otimismo
crença em contos
verdade mau contada
outrora é escuro abismo,
e o fim da linha revela o nada.

Tudo por uma Olimpíada


UM CARA



por Alexandre Mendes
.
Era um cara feliz

com seu empreguinho estável

bom esposo e pai amável

nada tinha a reclamar



possuía um Palio novo

virava a chave, sem problema

levava os filhos ao cinema

nada tinha a reclamar



Era um cara preocupado

jogou a carteira sobre a mesa

devido ao corte de despesa

sua esposa a reclamar



alguns meses sem trabalho

desempregado e com fome

sua mulher com outro homem

resolveu lhe abandonar



Era um cara quase triste

sem emprego, sem família

trancou a casa, pé na trilha

sua existência a lamentar



tentou ser forte 

e achou graça

trocou a honra por cachaça

e parou de reclamar



Era um cara desvairado

sem caminho ou direção

bebendo água de valão

debatendo com o ar



perdeu memória

perdeu a vida

correu pro meio da avenida

pra frente de um caminhão



Era um corpo destroçado

lá jazia o defunto

- Era só um vagabundo!

rabecão já vai chegar

DEVANEIOS DO PROFETA


Por: Nihildamus
   ...e haverá muita opressão contra os mais pobres, de tal forma e tamanha rigidez, que os explorados se levantarão contra os poderosos. Os lobos de gravata, então, se prevalecerão, através de leis instituídas para massacrar os mais fracos...            
  
Extermínios em massa, através da fome, desemprego, violência e fatalidade. Os chacais de Hugo Boss só cessarão suas práticas genocidas, quando não restar um marmiteiro de pé.                                                                                                             
Somente, quando chegar o dia em que o sol nascer novamente, os perversos perceberão que a sede de poder e controle, cortara seus próprios pés e braços, tornando-os fracos por estarem imóveis...

A REVOLTA DAS PALAVRAS

Por: Alexandre Mendes

- Quem foi que colocou uma interrogação no final dessa frase?
-Foi o mesmo canalha que botou uma exclamação no final dessa aqui.
TUMULTO e HISTERIA
MARTELO BATENDO
-Silêncio! Senhores substantivos, adjetivos, senhoras preposições e palavrões. Quem nos enfraquece são as vírgulas que estão entre nós!
- Nós? Balela! O culpado disso tudo é o cara que escreveu esse texto!
                                                      -É! Então vamos bagunçar o nome dele!
TUMULTO e CORRERIA
- É isso mesmo!
MINUTOS DEPOIS:
Ladrenxae Semned: Opr
- Palavras sacanas! Eu mereço! HEHEHHEHE...

Cocôtidiano

Por: Alexandre Mendes


Posso engraxar teu sapato?
Limpar seu jardim?
Sangue bom, me arruma um cigarro?
Me descola um real?
Paga um salgadinho?

Moço, mata minha fome?
Posso tomar um golinho?
Um copinho?
Botar na sua conta?

Uma semana, sem comer!
Já é, parceiro!
Deus lhe pague
Muito obrigado

FLOCTOT

Por: Alexandre Mendes


O vazio dos corpos
oculto atrás da porta
pura natureza eterna
da puta santidade morta

A fantasia do que chamam de real
transformada em reflexão
refletida como normal
nos traz a suposição

que o belo pode ser feio
e o infinito, ter fim
máscaras de cobre e ferro
rostos diabólicos, no jardim

Espectro poesia da madrugada
A lua distancia-se de mim
Alvorecendo a desgraçada
dor de cabeça no fim

AO PATRÃO, COM CARINHO

Por: Alexandre Mendes

Como vai, velho canalha!
Por muitos anos, dia após dia,
enchi teu bolso de alegria
na minha carteira, quase nada
suor pingando; garganta seca
trabalhei duro; sol escaldante
e você lá no restaurante,
tacinha de uísque sobre a mesa

Como vai, velho safado!
Por muitos dias, ano após ano,
me usou bastante e deu o cano
Lamentei desamparado
mão com bolha a calejar,
pé descalço e rachado
e você lá no Corcovado
com sua prole a passear

Como vai, seu velho fútil!
Depois de anos e alguns dias
me sugando as energias
transformou-me em um inútil

quando pensei em parar,
vi que não contribuía,
negada aposentadoria
continuou a me explorar

Como vai, velho imundo!
Vai como, velho picareta!
Espero um dia te encontrar sentado
no colo em brasas do capeta!

CARTÃO CIDADÃO

Por: Alexandre Mendes


O mesmo despertador tocando
O mesmo uniforme
O mesmo ônibus
O mesmo cobrador
O "bom dia" no mesmo tom
As mesmas caras
Clientes de sempre
com as mesmas falas de ontem

Pensamentos sombrios
e libertadores
pairam na mente do ser
o mais estranho
são sempre os mesmos
dia após dia

- Saia da casca, sujeitinho!
Faça o que tu queres
A liberdade é um segredo
guardado a sete chaves
pelos manipuladores
A casca que te envolve;
a coleira que te puseram,
um belo dia,
lhe trará a loucura

Fuja...fuja
o mais rápido que puder
antes que o dia
se torne noite
e não consigas mais
encontrar a saída...

Suba logo nessa cadeira
e pule, rumo a liberdade
não pense duas vezes
e descanse de todo o mau
que te cerca, nesse momento

Depoimento de A.M. quando conversamos pela primeira vez sobre o Coletivo (em 2011)

ONTEM NA CANTAREIRA

Por: Alexandre Mendes

Foi muito legal, a reunião desreunida que promovemos no pé do índio Araribóia, nas Barcas de Niterói. Tive a oportunidade de reencontrar meus velhos parceiros de trabalho, Winter Bastos e Fabio Barbosa. O artista mineiro, Wagner Teixeira, também compareceu e pude, finalmente, conhecê-lo pessoalmente. Bebemos, trocamos idéias, rimos e nos divertimos. Ganhei presente de natal atrasado (Valeu, Ronald!) Confabulamos sobre a possibilidade de produzirmos um novo trabalho em conjunto. Quadrinhos, poesias, contos, entrevistas etc.

Fiquem espertos, meus caros leitores. Algo novo deverá surgir no horizonte, a qualquer momento!

Obs: Só faltou o meu amigo,
 Diego El Khouri, estar presente no evento.

O TROCO DA GORJETA


Por: Alexandre Mendes

  - Ô, Francisco! Me serve um chopp, aqui! – Gritou o cliente da mesa dez.
  Assinval correu até a serpentina, com a taça na mão. Já conhecia aquele cliente e sabia que o cara era “carne de pescoço”.
  - Ô mestre! Tá aqui, bem geladinho! - Disse o pobre garçom, servindo a bebida. O sorriso era forçado.
  - Porra, Severino! Já te falei que eu gosto de colarinho! – O pessoal da mesa ao lado, ria da brincadeira.
  - Desculpe, patrão! Vou tirar outro chopp pro senhor.
   
Fazia dez meses, que Assinval havia chegado ao Rio de Janeiro. A lembrança de Mossoró vinha a tona, quando via a foto de Teteca, sua jovem e bela esposa. Ele a deixara a sua espera, com a promessa de voltar um dia, com dinheiro suficiente para montar seu próprio negócio. As cartas de Teteca eram freqüentes para Assinval. Como o rapaz já havia morado em três pensões diferentes, desde que chegara ao Rio, as cartas eram enderaçadas para o restaurante, onde ele trabalhava.

  Seu sorriso brilhava, quando o gerente dizia: “Xinval! Carta para você, aqui, rapaz!”
  Assinval corria para ler as juras de amor da sua princesa do agreste, no banheiro.

- Ô, Ceariba! Cadê o bife que eu te pedi? – Era o cliente da mesa dez, atormentando a vida de Assinval, novamente.
 - Um momento, por favor. Vou lá na cozinha, dá um pito neles! – Disse Assinval, paciente como sempre. O cliente da mesa dez era o centro das atenções, quando começava de chacota com a cara do garçom.
 - Poxa, pessoal! Aquele cara; o da mesa dez, não é fácil, não! Cadê o bife dele?
 - Desculpe a demora, Assinval. Mas tem cliente na frente.
De repente, entra o gerente na cozinha:
 - Xinvaldo! Tô te procurando, um tempão! Carta pra você, meu filho!

Assinval se esqueceu do chato da mesa dez e correu pro banheiro. Mais uma cartinha dela, sua amada, Teteca.

   “Assinval, meu esposo amado.

    Não sei como te dizer. Tenho muita saudade de você. Dez meses que não te vejo. Pra matar saudade, só em foto. Pois é. Pra dormir, só agarrada a uma foto sua. Acontece que, uma noite dessas, coloquei a sua foto no meio das minhas pernas, desejando você aqui. Não sei explicar. Sonhei com você, aquela noite. No sonho, fazíamos nheco-nheco. Agora, meu amor, acho que você não vai acreditar. Senta, que lá vem a bomba.
Você me engravidou, através do sonho ou da foto no meio das minhas pernas. Sei lá. A única coisa que posso te afirmar é que estou grávida de seis meses. Parabéns, papai.

                                                                                                    Te amo muito.
                                                                                                            Teteca.”

   Assinval ficou atônito com a notícia. “Grávida em sonho? Essa rapariga pensa que sou algum otário?” Começou a socar a parede de raiva. “Vadia! Eu mato ela!” – Sofria sem dar uma palavra.

BATIDAS NA PORTA DO BANHEIRO: - Xivaldo! Abre aí! O bife com fritas da mesa dez!
O rapaz abriu a porta. Prendia o choro e o desânimo de viver. Foi até a cozinha e pegou o bife com fritas, na bandeja. Olhou pela escotilha da porta: o cliente pentelho retrucava com o casal da mesa nove, provavelmente, falava mal do rapaz.

   Assinval, discretamente, entrou com a travessa de comida no banheiro dos funcionários e trancou a porta. Descansou a bandeja, em cima do tampo da privada. Sacou o pênis para fora e começou a imaginar Teteca nua, entregue aos seus beijos e carícias, na sua cama de madeira, recém comprada, lá, em Mossoró.
“Toma...ai...ai...Agora faço um filho em você!” Assinval despejara todos os seus herdeiros sobre o bife do bundão da mesa dez. “UUUUUUIIIII!!!!!”

Já, lá fora: - Porra, Genivaldo!!! Caralho!! Que demora!
- Desculpa, chefe! Tá aqui, o bife com fritas do senhor. – Assinval fazia cara de babaca; aquela que já estava acostumado a fazer.
- Ué. Eu não pedi molho branco! Ah! Vou comer assim mesmo!
 O cliente degustou o bife, sem respirar: estava morrendo de fome.
Como era de costume, Assinval recebeu, junto a comanda, a gorjetinha simbólica de cinqüenta centavos. – Vai juntando! Um dia paga a passagem de volta, no pau de arara.
Assinval sorriu e pensou: “AAAAAAAAAAA!!!! MUITO OBRIGADO, TETECA!!

PESTINO

Por: Alexandre Mendes



Ele odeia o que faz
entretanto
nisso, manda muito bem
vincula
bom dia e obrigado
desvincula
e amém

Carrinho de brinquedo
 pequenino
tentando virar trem
vincula
bom dia e obrigado
desvincula
e amém

Canudinho de coca cola
bem fininho
querendo ser tubo de cem
vincula
bom dia e obrigado
desvincula
e amém

Cidadão desconhecido
uma sombra
querendo se tornar alguém
vincula
bom dia e obrigado
desvincula
e amém

Apagando o seu passado
põe negrito
o que ainda vem
vincula
bom dia e obrigado
desvincula
e amém

Lutando sempre contra
o *pestino
procura ir pra mais além
vincula
bom dia e obrigado
desvincula
e até amanhã

Cotidiano


SEU MANEL - uma homenagem ao próprio

Por: Alexandre Mendes
























Já bem de noitinha                    abaixam a mira                   Tiana lhe espera
subiu a ladeira                          prossegue tranquilo             caixote o portão
passou pela vala                       lhe chamam coroa               na boca estalinho
ponte de madeira                     mais velho antigo                 kisuco e macarrão
paredes de tábua                     lá é o terror                          se deitam alegres
e arame farpado                      ou então paraíso                  pois já é domingo
cachorros latindo                     a pólvora manda                  de folga escala
olhar cabisbaixo                      obedece o juízo                     três horas
moleques de toca                     lá falta concreto                    o Bingo
lhe avistam do beco                 esgoto e dente
pra alguns alegria                    embosso lajota
pr'outros desespero                 prossegue contente

SANTO DIAS


Por Alexandre Mendes

Santo Dias da Silva, operário paulista, foi um dos grandes exemplos na luta pelos direitos dos metalúrgicos, durante a ditadura militar. Nascido em Terra Roxa, no interior de São Paulo, em 22 de fevereiro de 1942. Trabalhava na roça de café, com seu pai e irmãos, como meeiro. 
A partir de 1960, Santo e outros trabalhadores da Fazenda Guanabara mobilizaram-se contra a forma de participação nos lucros da colheita (obtinham o alimento no armazém fiado durante o decorrer do ano e recebiam pouco dinheiro, após descontos). O dono da fazenda dispensou sua família e as demais que participaram do movimento.
 Mudou-se para Viradouro e passou a trabalhar com sua família como bóia-fria. Tentou lutar por condições melhores no novo ofício e foi novamente dispensado. 
Em outubro de 1962, deixou sua família e foi tentar a sorte na capital. Conseguiu um emprego de ajudante geral na Metal Leve, empresa de componentes metalúrgicos. Participou de sua primeira greve por aumento salarial e instituição do 13º. Aquele ambiente politizado (metalúrgicos) mudou seu destino... 
Casou-se em 1965, ano em que nasceu seu primeiro filho. Em 1967, participou da formação da Oposição Sindical, que consistia na idéia de um comando gerado dentro de cada fábrica. O movimento contava com a participação de católicos, marxistas e operários independentes. Ainda nesse ano, nasce sua filha.
    A sucessão de greves e passeatas ocorridas no ano de 1968, resultaram no endurecimento da ditadura e a institução do AI-5. A Oposição Sindical lança a chapa verde, concorrendo às eleições do Sindicato, mas perde, devido às propostas populistas da chapa situacionista. As greves se alastram por São Paulo e Minas Gerais e a polícia recrudesce e ocupa os locais. Santo Dias, além de estar envolvido com a oposição do Sindicato dos Metalúrgicos, torna-se líder comunitário onde residiu na época (Jardim Margarida). Lembra a esposa dele, Ana Maria do Carmo Dias: " Nessa época, a repressão era tanta que a gente ia comprar pão na padaria juntos, eu e o Santo, com medo de ser presos se fôssemos sozinhos". 
Em 1972, Santo foi trabalhar na Burndy do Brasil, onde organizou a comissão de fábrica, mas foi demitido. A Oposição Sindical Metalúrgica criou o grupo chamado Interfábricas. Santo Dias teve uma significativa participação no projeto. Passava madrugadas panfletando em portas de fábricas, com sua mulher e ajudava os moradores da sua comunidade. 
Em 1973, intensificam o número de greves. Santo volta a trabalhar na Metal Leve. A Oposição é atingida pela prisão de cinquenta militantes em 1975, anulando a possibilidade de concorrer às eleições do ano. Entretanto, sob o lema "Trabalhar dentro da fábrica", promoveram ações nas comunidades, com a reivindicação de escolas, creches, água, luz, regularização dos loteamentos clandestinos e contra o alto custo de vida. Criaram fundos de greves, prestando ajuda aos que perdiam o emprego. 
Em julho de 1978, a Oposição concorre às eleições com Santo para vice. Em 1978, perde o emprego na Metal Leve, estratégia dos situacionistas, a fim de impedir sua candidatura. Consegue às pressas um emprego na Alfa Brás. As eleições acontecem, mas a chapa situacionista vence, por meio de fraude: " ...via-se claramente que a urna e os votos tinham sido trocados. Uma pessoa só fez o x nas cédulas." Tentaram três mandados de segurança contra a posse irregular e perderam. Santo Dias é demitido da Alfa Brás em 1979. A repressão intensifica e Santo assume o comando das greves, como um de seus integrantes. Decidiu ajudar em um piquete à frente da Fábrica Sylvania, em 30 de outubro de 1979. Com a prisão de um dos grevistas, Santo pediu que o soltassem, mas foi negado seu pedido. Conformado, deu às costas para a polícia. O policial militar Herculano Leonel, sem motivo aparente, apontou sua arma para Santo Dias e lhe deu um tiro nas costas. Os soldados  jogaram seu corpo no camburão e o levaram para o Pronto-Socorro, já sem vida. Parentes e amigos correram para lá, afim de evitar que seu corpo sumisse. Seu enterro foi concorrido, com discursos, inclusive o do sindicalista Lula.
   A partir daí, todos os anos, no dia 30 de outubro, às 14:00(horário de sua morte), pintam de vermelho, em frente à Fábrica Sylvania: 
"Em 30 de outubro de 1979, aqui foi assassinado pela PM o operário Santo Dias da Silva, defendendo os direitos da classe trabalhadora".
Depois caminham até seu túmulo, onde prestam homenagens.
Santo Dias era um homem inconformado com as mazelas do sistema e não deixou se dobrar.