Por Fabio da Silva Barbosa
Todo
dia venho vê Princesa. Ela tá sempre ali esperando. Conheço bem aquelas patinha pro alto.
Um
dia, tinha uns menino jogando pedra pra vê se a barriga dela explodia. Fiquei
braba e botei todo mundo pra corrê. Se eu pego, arrebento.
Já
chega o que ela sofreu lá em casa. Papai disse que ela pegô ziquezira. No fim,
ela já nem andava mais.
Um
dia, Papai pensô que eu tava dormindo e foi pro quintal. Esperei um poco e fui
atrás. Ele tava com um saco na cabeça da Princesa e apertava o pescoço dela.
Ela só tremia a perninha. Voltei pra cama assustada.
Por
que Papai tava fazendo isso com ela?
No
dia seguinte ele me acordô cedo pro colégio. Tava com cara triste. Corri pro
quintal, onde Princesa costumava ficá. Ela
não tava.
-
O que aconteceu com Princesa?
-
Não sei, minha filha. Acho que fugiu.
Papai
respondeu de cabeça baixa. Acho que desde que mamãe foi embora de casa ele não
ficô tão triste. Ele também gostava muito da Princesa. Ela sempre esperava ele
chegá do trabalho. Quando via ele vindo na estradinha, ia correndo pulá na
perna dele, sujando a calça de barro. Papai gostava daquela festa. Eu vinha
logo atrás e pulava nele, agarrando no pescoço. Papai era forte e guentava nós
duas fazendo festa.
-
Mas ela tava doente que não conseguia nem andá.
-
Deve tê melhorado e fugiu no meio da noite. Vamo logo pra você não chegá
atrasada.
Ele
me deu a mão e fomo em silêncio pela estradinha. Chegamo na pista e atravessamo
a primera parte dela. Tinha um rio que separava a primera parte da segunda. De
cada lado o carro ia numa direção diferente. Vi que Papai acelerô o passo e
resmungô alguma coisa quando passamo pela ponte. Acho que era pra prestá
atenção na aula e voltá direto pra casa sem ficá me distraindo pelo caminho.
Na
volta, pulava pela ponte olhando as coisa que passava boiando por baixo, como
fazia sempre. Mas, dessa vez, quando olhei pro rio, vi as patinha dela pro
alto. Era princesa. Eu tinha certeza.
Naquele
dia papai voltô bêbado pra casa. Não conseguiu acordá cedo pra me levá pro
colégio. Levantei atrasada e fui correndo.
Ela ainda tava lá.
A
cada dia que passava, a barriga dela tava mais inchada. Devia tá bebendo muita
água. Um dia gritei pra ela se virá.
-
Virá a cabeça um poco pra fora dágua.
Ela
nem se mexia. Ficava lá, com as patinha pro alto. De vez em quando parecia que
eu via a patinha dela tremê, igual naquele dia que Papai apertô o pescoço
dela.
Papai
nunca mais foi do memo jeito. Ficô pió de quando mamãe sumiu junto do vizinho.
Ele nunca mais me levô pro colégio e todo dia chegava tarde e bêbado.
Pelo
menos eu ficava ali olhando Princesa. Cuidando dela de longe. Se a água do rio
não fosse tão suja, eu decia lá pra pegá ela. Fazê um carinho naquela
barriguinha inchada dela. Mas só o chero daquela água fazia mudá de ideia. Podia
pegá ziquezira e depois Papai ia tê de apertá meu pescoço tamém.
Um
dia a chuva veio forte. A água do rio tinha subido e levava tudo pela frente.
Olhei de cima da ponte e não vi as patinha pro alto, nem a barriga inchada.
Tinha uma cadera ali perto que também não tava mais. Era tudo água e coisa
passando rápido.
Dois
dia depois a água já tinha voltado ao normal, mas Princesa tinha ido embora.
Cansô de ficá ali bebendo água, de perna pra cima.
Cheguei
em casa e Papai tava dormindo. Não tinha ido trabalhá. Acordei ele e pedi pra
ele melhorá logo. Agora só tinha a gente e não era hora de ficá doente também.
Ele
ficô me olhando e depois me abraçô forte.
No
otrô dia ele começô a melhorá.